sábado, 8 de março de 2014

29. CONVERSAS PARALELAS DE MARIAS E EVAS

  
  

Num final desses de tarde, elas se encontraram para conversar. Poderia ser só de choro, lamentos, ou ainda duas mulheres a esbravejar. Mas, as duas, naquele final de tarde, em meio a brisa da beira mar montaram seu atelier de conversas paralelas, como se estivessem a se confessar.
Maria, a todos ouvidos, com seu olhar de escuta, observa os pássaros aninhando-se nas árvores - para na noite repousar. Escuta a sua volta as conversas paralelas  de quem freqüenta  aquele lugar. - Analisava o pescador  na sua solidão,  e o barco que navegava nas águas calmas daquela baia a “cumpliciar-se” com o pescador a lançar sua  rede ao mar.
E a conversa se fez, alinhavando em costuras com retalhos dos últimos feitos - como se fossem suas vestes as mortalhas que cobrem as sepulturas de seus próprios corpos, inertes em seus leitos.
E por meio das estrelinhas que compunham os seus textos - elas, as entrelinhas é que sustentavam aqueles medos. Pois a verdade nua e crua entrava rasgando a carne como açoite naqueles peitos. Falavam de tantas coisas, indo a tantos lugares. Elas só não conseguiram entender, como podem os ermitões, viverem em clã, como se não fossem pares.
E falaram das novas vidas que em forma de  embriões -  anunciam o nascimento,  alguns solitários  e outros já chegam duplicados, embora  humanos.
Falaram das coisas da vida - da loucura, que o outro nos impõe, e depois dos  abandonos, como se nunca tivéssemos sido os nossos próprios donos.  Falavam  de mata borrões que marca o próprio corpo como forma inconsciente de provar que não se está morto. E depois veio o desejo, mesmo que torto, de ferir a linha do tempo e escrever novas histórias, com lápis coloridos e telas de aquarelas como se as histórias dos “Outros” pudessem uma dia ser somente delas.
E Maria e Eva, falaram de roupas usadas, dos descartes daquilo que um dia nos foi útil. Das arrumações dos guardas roupas, que se fazem desnecessárias, das pinturas das paredes de suas casas.  - Não importando se serão brancas e azuis, ou brancas e amareladas, ou ainda de que são  feitas - de madeiras ou envidraçadas,  suas janelas. Falaram de rolhas de cortiças em jarros de vidros aprisionadas, que moravam nas garrafas de vinhos.
E o sabor do suco de limão a sucumbir-se entre o aroma do camarão  convidando-as  a navegar nas nuanças gustativas entre o olfato e o paladar, dava um olhar diferente para o que estava fora do alcance daquela visão.
E refletindo aqueles papos, que pisaram em pés retorcidos que pendurados ate doíam - as duas – Maria e Eva  muito embora registradas em papel se perdem naquele final de tarde, muitas vezes confundindo a própria identidade.
E das conversas de entre linhas que escrituravam aqueles textos, muitas vezes se faziam tortas. Falou-se de tantas coisas que misturadas à sensibilidade roubaram de “Cesar o que era de Cesar” - diferenciando os diversos sabores que num mix gustativo entre o doce e o salgado, o azedo e o amargo decantavam o sabor do silêncio, que isolado, fere o peito confundindo os sentimentos de quem esta ao seu lado.
E Maria e Eva cada uma seguindo seu rumo  foram embora mais uma vez. E pegaram  suas estradas, e entre retas e curvas a perder-se  nesta imensidão ficaram sem entender  ao certo  o que é esta imerso no deserto da solidão.
Albertina Chraim